Dogman: O brilho do artista criminoso

23/02/2024
Cartaz de Divulgação do filme Dogman retirado do Google
Cartaz de Divulgação do filme Dogman retirado do Google

Por Thábata Cabrini

Na noite de ontem - quinta-feira - senti uma vontade inexplicável de assistir um filme.

Meu pai, que é um cinéfilo tanto quanto eu porém com um dedo podre horroroso de escolha, perguntou-me o que eu queria assistir e lhe sugeri um filme de terror. O meu companheiro de tela não se empolgou muito com a minha sugestão, mas em meio à um catálogo de filmes, escolhemos um menos provável e que já tínhamos certeza que não seria bom, saindo mais uma vez frustrados.

Ainda bem que nos enganamos, ou melhor, Dogman nos enganou.

Logo no início do filme notamos que a obra de origem Francesa, do diretor Luc Besson havia passado no festival de Veneza, e logo alertei meu pai que era para se preparar por que talvez seria conceitual e fora do padrão de clichês que a maioria das vezes sentimos prazer em assistir, mas garanto a vocês leitores, que nunca me enganei tanto em um palpite quanto ontem, embora não lamente nada do meu engano, e meu pai retrucou a mim:

- Eu só colocarei uns minutos, se for ruim tiramos.

Aceitei o destino que me esperava sem qualquer expectativa boa, até o ator Caleb Landry Jones surgir em cena travestido à la Marilyn Monroe no filme "Os homens preferem as loiras" de 1953 em que diva do cinema canta "Diamonds are a Girl's Best Friend" com seu vestido pink de cetim e dessa forma o personagem com um cigarro na mão, maquiagem feminina toda borrada na tela virando para cumprimentar com toda a finesse do mundo uma psiquiatra chamada Evelyn, preta, mãe solo e funcionária pública que fora designada a avaliá-lo.

Nesse momento comentei com meu pai:

- Nossa pai, acho que vou criar empatia com o vilão!

Dito e feito, apesar das opiniões negativas dos críticos de cinema dos veículos de comunicação populares, que dizem que o filme é absurdo, a pior obra de Besson e que somente o que salva são os cachorros, eu como telespectadora, escritora além de assídua leitora de dramas vi alguns pontos interessantes que merecem ser ressaltados, assim como alguns erros que não podem "passar batido", que também serão abordados.

A história se trata de Douglas – Doug - que tem uma infância totalmente traumática com seu núcleo familiar composto de um pai violento e abusivo que ganhava dinheiro com rinha de cachorros, uma mãe submissa – que retrata o perfil da maioria da mulheres em décadas passadas – e um irmão insano que gosta de judiar do protagonista, fomentando as loucuras do pai.

O ápice do horror começa quando o irmão flagra Doug acariciando os cachorros e lhes dando comida escondido e dedura ao pai, que questionando Doug se este sente amor pelos cachorros mais do que pela família, ouve do filho que sim e fica transtornado. O resultado da intriga foi o maldoso pai jogar Doug preso no meio do criadouro dos cachorros para viver lá, faça chuva ou faça sol. Durante esse tempo, a mãe do protagonista foge grávida, e ele se afeiçoa cada vez mais pelos animais, que demonstram um afeto genuíno pelo menino.

É nesse momento que surge o vínculo profundo de amizade com Doug e os cachorros, porquanto a vivência no mesmo ambiente que eles criou uma conexão mental e de comunicação que os animais passam a ser seus verdadeiros amigos, protetores e que terminam por salvar a vida do personagem várias vezes e fazendo-o desacreditar na bondade humana.

Inclusive, é nessa circunstância que o pai de Doug atira nele fazendo-o perder um dedo, ficar paraplégico e como dito acima, um dos cachorros é quem vai até a polícia com o dedo de Doug dentro de um plástico lhes mostrar o endereço do cativeiro do menino.

O resgate acontece, e o pequeno passa a viver em um abrigo onde através de Salma, seu único e verdadeiro amor platônico, cria amor pelo teatro e pelas obras de Shakespeare, afinal de contas: "Quem recita Shakespeare, sabe fazer qualquer coisa" . A atriz também ensina o garoto a se maquiar e ler. Posteriormente, Salma segue sua carreira como atriz, faz sucesso e Doug já adulto vai assisti-la na Broadway, levando consigo um livro com todos os registros de espetáculos que esta já fez, entretanto, apesar de se emocionar com a atitude do protagonista, a mesma já está casa e grávida, que resulta numa grande frustração para Doug.

A vida adulta de Doug é marcada por inúmeras dificuldades que humanizam o personagem e demonstram com veracidade a hipocrisia da sociedade, além das dificuldades sociais das pessoas PCD's e orfãs. Após ser expulso do abrigo de cães em que era tutor por ganância da prefeitura que iria construir no local um grande prédio, nosso vingador some e leva consigo todos os animais, passando a morar em um local abandonado, escondido dos olhares das pessoas.

Para sustentar a si próprio e seus fiéis companheiros, começa a procurar emprego em vários locais "de bem" anunciados nos jornais, e em todos esses lugares recebe negativas com olhares de preconceito e desprezo, sendo que o único lugar que lhe dá emprego – após certa insistência – é um cabaré onde se apresentam Drag's Queen's talentosissímas. É nesse ponto que a história tem seu ápice, pois toda a dor que o personagem sente, todos os preconceitos e limitações físicas que este tem caem por terra com ele performando "La Foule" de Edith Piaf. É fascinante a entrega do ator Caleb, que emociona quem assiste sabendo a história do personagem Douglas Munrow e todo o seu calvário até então.

É fascinante a entrega do ator Caleb, que emociona quem assiste sabendo a história do personagem Douglas Munrow e todo o seu calvário até então.

Doug passa a se apresentar todas as sextas-feiras e sem se aperceber, começa a se envolver no mundo do crime, ou melhor, seus cachorros passam a se envolver por ele. Em troca de proteção, as pessoas prestam alguns pequenos serviços para Doug como por exemplo uma lavadeira, afinal de contas os doguinhos extremamente fiés e inteligentes ao seu dono são verdadeiros justiceiros, que roubam dos ricos e dão aos pobres e coagem chefes de milícias que exploram os pequenos comerciantes locais.

A história vai se desenvolvendo de tal forma que, apesar de Doug e seus amigos caninos atacarem algumas pessoas que colocam suas liberdades em perigo, é impossível não sentir empatia com a dor do personagem e notar inúmeras críticas sociais, que sempre dão a entender que a mesquinhez da sociedade incentiva a criminalidade (nada de novo sob o front não é mesmo?).

Apesar do final do personagem ser incrível fomentando o título "Homem Cachorro", há alguns pontos que me incomodaram grandemente e que me deixaram demasiadamente confusa, sendo um deles a falta de ambientação ao retratar a infância e adolescência de Doug, assim como a saída de seus parentes da prisão. O cenário da infância de Doug que remonta uma década passada, talvez anos 60, não condiz com o mostrado no filme. Fiquei indignada com o fato de o cachorro estar com o dedo de Doug criança na boca levando até a polícia e todo o cenário, as ruas, os carros, serem totalmente modernos, além do irmão, que sai da prisão com uma roupa estilo anos 70 e todo o ambiente em volta ser atual; A linha temporal foi a mesma em várias cenas me confundindo bastante, o que me faz questionar até agora se esse foi o estilo do filme ou foi um erro absurdo (se alguém souber me explicar, por favor, se manifeste porque gostaria de saber!).

Outra coisa que me incomodou muito mas na vida real foram algumas críticas; Por exemplo o filme no Rotten Tomatoes ter sessenta porcento de aprovação e os intelectuais brasileiros com um pouco caso gritante alegando que o filme é "absurdo", que "foge da realidade" e tantas outras baboseiras que nem vale a pena comentar. Meu honesto ponto de vista é que se alguém quiser ver retratações de crimes reais, existem documentarios true crime de muita qualidade nas plataformas de Stream e o programa do Datena que passa todos os dias então dá pra assistir tranquilamente, pois nitidamente que um filme chamado "Homem Cachorro" ou "Cachorrão", misturaria algo "viajado" – como por exemplo a conexão espiritual e mental dele com os cachorros. Só quer algo racional quem não entende a idéia proposital de loucura do filme que se confunde com o racional.

Ademais, como os críticos podem ignorar o fato de tantas críticas sociais serem feitas? É notável que o filme não tem a qualidade dos filmes queridinhos da Academia do Oscar, mas para quem gosta de obras de drama e aprecia atuações, o filme que não prometia nada, entregou tudo.

Ademais, como os críticos podem ignorar o fato de tantas críticas sociais serem feitas? É notável que o filme não tem a qualidade dos filmes queridinhos da Academia do Oscar, mas para quem gosta de obras de drama e aprecia atuações, o filme que não prometia nada, entregou tudo.

E ai, já assistiram esse filme? Ficaram curiosos para saber mais da história? Tem um ponto de vista diferente? Comente aqui! Até a próxima resenha!

Thábata Cabrini - blog
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